É óbvia a responsabilidade no estado da urbe dos dois maiores partidos que estiveram à frente do município
Como a 1 de Outubro se vão realizar eleições autárquicas, é oportuno um balanço das quatro décadas de poder local em Coimbra, cidade que reflecte no plano político algumas tendências globais do país. Assistimos em Coimbra desde 1976 à alternância no poder entre o PS e o PSD, este por vezes aliado ao CDS, ao PPM e a outros grupos de menor expressão. A série de resultados foi: PS,PSD,PS,PSD,PS,PS,PS (três vezes Manuel Machado), PSD, PSD, PSD (três vezes Carlos Encarnação) e PS (de novo Manuel Machado). Das 11 eleições já realizadas, seis foram ganhas pelo PS e cinco pelo PSD e seus aliados. Mais à esquerda, a CDU caiu de 22% em 1979 para metade em 2013. O BE começou com 2% em 2001 para chegar aos 9% em 2011, embora dissolvido num movimento que se diz independente (“Cidadãos por Coimbra”). Nas autárquicas coimbrãs o eleitorado mostrou uma descrença crescente: a abstenção passou de 39% em 1976 para 51% em 2013. Tal fez com que o actual presidente, Manuel Machado, tenha sido eleito com os votos de apenas 18% dos eleitores, o mais baixo resultado de sempre.
É inegável que a cidade não é hoje a mesma que em 1976. Desenvolveu-se na educação e na saúde, onde já era forte: a Universidade cresceu, ganhando visibilidade internacional (é Património Mundial da Humanidade), e o Centro Hospitalar Universitário (CHUC) continua a ter alguns serviços de ponta. Surgiram também novos negócios, como na área do software. Mas o balanço não é brilhante. Coimbra perdeu indústria tradicional, mas também serviços, já que muitos deles foram sendo centralizados em Lisboa. A cidade deixou de ser atractiva para os jovens: por falta de empregos, aqueles que nela se formam vêem-se obrigados a demandar outras paragens. E a cidade degradou-se, com a destruição do centro histórico para dar lugar ao metro-que-ia-haver-e-afinal-não-houve, com a falta de afirmação nacional em áreas como a cultura e o desporto (Coimbra Capital da Cultural 2003 correu mal e a equipa de futebol da Académica caiu na 2.ª divisão, onde vai continuar), com o atraso no digital (Coimbra está num lugar miserável no ranking da transparência municipal), com a desertificação da Baixa, cujo comércio foi sugado pelo centros comerciais da periferia, e com a deterioração da Estação Velha, onde os passageiros têm de atravessar as linhas. Serviços essenciais a qualquer cidade (Palácio da Justiça, Biblioteca, Rodoviária, etc.) estão em Coimbra anquilosados. Jardins e parques estão ao abandono: o último investimento em zonas verdes, o Parque Verde do Mondego, foi inundado pelo rio. É certo que houve obras recentes como o Estádio, o iParque e o Convento de S. Francisco, mas são elefantes brancos, onde nada de relevante se passa.
É óbvia a responsabilidade no estado da urbe dos dois maiores partidos que estiveram à frente do município. Esses partidos estão, aliás, muito partidos: o PS de Coimbra tem tido casos nos tribunais e o PSD tentou um truque pouco democrático, quando Carlos Encarnação se demitiu a meio do mandato para colocar um seu protegido. Hoje o PS não tem mais ninguém para apresentar do que o “dinossauro” que já lá esteve 16 penosos anos e quer estar mais quatro. A Câmara está cega, surda e, não estando muda, seria melhor que o estivesse: a sua última fala foi para protestar pela construção pelo CHUC de um silo automóvel há muito reclamado. Quanto ao PSD, não tem mais ninguém para apresentar do que outro “dinossauro”, Jaime Ramos, que já foi quatro vezes Presidente da Câmara de Miranda do Corvo. Na esquerda radical, na CDU nada muda. E BE significa em Coimbra Bloco Escondido, pois concorre sob o nome de “Cidadãos por Coimbra”, que, subavaliando as suas forças e sobreavaliando as alheias, foi buscar o seu cabeça de lista à CDU, preocupado não tanto com a cidade mas mais com as lutas das esquerdas.
Em democracia há sempre soluções. Dado o menosprezo com que PS e PSD têm tratado Coimbra, cidadãos de vários partidos e muitos, como eu, independentes, criaram um movimento, “Somos Coimbra”, que visa dar um futuro a Coimbra. Tal como o Porto foi capaz de eleger um independente, que colocou a cidade acima do resto, Coimbra também o deveria fazer. Coimbra é conhecida por ter passado. Agora precisa é de futuro.
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