Fotografia: Paulo Novais/Lusa
Intervenção do vereador José Manuel Silva na Reunião de Câmara de 13/01/2020
Entre os muitos assuntos atuais, decidi abordar hoje a questão das recorrentes cheias do Mondego, para recordar que um desassoreamento mal feito tem más consequências.
O Somos Coimbra, o MPT, a Quercus e outros avisaram, mas o Partido Socialista não quis ouvir, preferiu fazer um meio e mal feito desassoreamento. Assumam agora as responsabilidades políticas e económicas.
Não estão em causa os efeitos da chuva superior aos valores habituais e a conjugação de duas depressões, fenómenos que se tornarão cada vez mais frequentes e para os quais temos de estar devidamente preparados.
Não está em causa o empenhado esforço e dedicação das várias entidades competentes para minimizar e controlar os riscos e os efeitos das cheias.
Também não está em causa o benefício de se terem dragado 700 mil metros cúbicos de sedimento a montante do açude-ponte.
Todavia, para além disso, tudo foi errado. Efectivamente:
Não foram retirados 500 mil metros cúbicos de sedimento, que ficaram no leito do rio a ocupar espaço. Porque não os retiraram, pois até ficaria barato, visto que as dragas já estavam do rio? Foi um gravíssimo erro não o terem feito. No projecto de execução inicial do desassoreamento do Mondego estava tecnicamente recomendada, porque realmente necessária, a retirada de 1,2 milhões de metros cúbicos de sedimento. Retirar 700000 m3 reduziu a dimensão das cheias em Coimbra, mas a decisão de não retirar 500000 m3 foi corresponsável pela enorme dimensão das cheias.
A foz do rio Ceira no Mondego não foi dragada, prejudicando o seu escoamento em período de cheia, agravando indiscutivelmente os efeitos das cheias na freguesia de Ceira. Foi um grave erro não o terem feito.
A insuficiente dragagem implica que em poucos anos o rio voltará a ficar completamente assoreado. Com quantos anos de atraso será planeado o novo desassoreamento? Convém lembrar que o recente desassoreamento foi feito com 20 anos de atraso e que se poderiam ter evitado ou minimizado os efeitos das cheias anteriores, como a de 2016, por exemplo. Foi um grave erro o desassoreamento não ter sido feito há mais anos.
Perante o erro do Partido Socialista, ao ter construído o Parque Verde em leito de cheia, o Somos Coimbra propôs que se aproveitasse o facto do Parque ter sido destruído por sucessivas cheias e se estar a fazer o desassoreamento parcial do Mondego, para usar as areias e subir a cota do Parque Verde. O Partido Socialista recusou e persistiu no erro. Como os fenómenos extremos se vão agravar, corremos o risco de ter o Parque Verde parcialmente destruído quase todos os anos.
Por outro lado, centenas de milhares de metros cúbicos de areia foram depositados a jusante da Ponte-açude, por iniciativa da APA, quando o rio já estava muito assoreado, porque é um rio de planície, como demonstravam as ilhotas que existiam no seu leito no Baixo Mondego. Na reunião do executivo de 30/07/2018, o Sr. Presidente da Câmara de Coimbra, em resposta às críticas, reconhecia que poderia haver “a jusante da Ponte Açude, um grave problema ambiental”, mas insistiu que tudo estava a ser bem feito. Confirma-se agora que não foi tudo bem feito e o grave problema ambiental aconteceu.
Obviamente, a areia colocada a jusante teve o efeito contrário à areia retirada a montante, foi ocupar espaço e depositar-se na zona de planície do rio, dificultando o escoamento das águas, podendo ter contribuído decisivamente para o rebentamento do dique em Montemor-o-Velho. Resolveu-se parcialmente o problema em Coimbra mas agravou-se o de Montemor-o-Velho...
Com o rebentamento do dique no local em que aconteceu, “por sorte” no local menos problemático para as populações, este excesso de areias contribuiu para a lama e areia que agora invade os campos do Mondego, prejudicando gravemente a agricultura. Será necessário retirar esta areia, uma despesa enorme. Quem a assume?
Lamentavelmente, ao contrário do que afirmou o Presidente da Câmara, a barragem da Aguieira continua a ser gerida em função dos interesses da EDP e não da razão principal da sua construção, o efeito de amortecimento das águas/cheias do Mondego, mantendo o caudal do Mondego entre os 1200 m3/s e o máximo de 1800-2000 m3/s. É inaceitável que, nesta época do ano e perante as previsões metereológicas, a Aguieira estivesse a 94-97% da sua capacidade, quando não deveria estar a mais de 80%, para garantir a eficácia desse efeito de amortecimento. Estas cheias também se devem à captura do Estado português pela EDP e pela China. Quem vai pagar os prejuízos?
Trinta anos depois, as obras de regularização do rio Mondego ainda não estão concluídas, não há um modelo de gestão da bacia hidrográfica do Mondego e o Governo de António Costa suspendeu a construção da barragem de Girabolhos, que adicionaria uma capacidade útil de regularização do Mondego de 245 hectómetros cúbicos de água.
É hora do PS assumir os seus sucessivos e graves erros e pedir desculpa aos munícipes de Coimbra e de Montemor-o-Velho. Mas é sobretudo tempo de colocarmos mais competência na gestão da Câmara de Coimbra e de exigirmos por parte do Governo português o necessário investimento na bacia hidrográfica do Mondego.
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