Texto apresentado na reunião do executivo da Câmara Municipal de Coimbra de 22 de Outubro de 2018 pela vereadora Ana Bastos
Durante a semana Europeia da Mobilidade, esta Câmara Municipal, consignou os trabalhos relativos à empreitada para requalificação dos Caminhos pedonais Celas – Baixa, incluída no Plano de Acção de Mobilidade Urbana Sustentável (PAMUS) do Plano Estratégico de Desenvolvimento Urbano (PEDU) de Coimbra. O projeto incide na requalificação e alargamento passeios do Largo da Cruz de Celas e das Ruas Augusto Rocha e Lourenço de Almeida Azevedo.
Apesar de se reconhecer os méritos deste projecto designadamente na sua contribuição para beneficiar a circulação pedonal ao longo de um circuito que carece urgentemente de requalificação e vivificação, que assegura a ligação entre as duas principais centralidades de Coimbra (praça da Republica e Cruz de Celas), e que procurou aproveitar a oportunidade criada pela disponibilização de Fundos Europeus no âmbito do Portugal 2020, a análise da solução preconizada para o Largo de Cruz de Celas, deixa-nos por um lado perplexos e por outro preocupados.
Se, por um lado é verdade que este largo carece de revitalização e um reordenamento que permita melhorar a circulação pedonal e até acomodar a circulação ciclável, tal preocupação não pode ignorar que se trata de um cruzamento que responde, em hora de ponta da manhã, a mais de 3000 veículos. Sublinhe-se que o sistema semaforizado atual foi otimizado para minimizar as demoras, e não apresenta qualquer reserva de capacidade. A solução agora apresentada traduz-se numa indiscutível redução da capacidade, pelo que perguntamos, como é possível que se tomem decisões desta natureza, sem que se tenham desenvolvido os correspondentes estudos de tráfego justificativos?
Se em Dezembro de 2016 quando se fez aprovar o ante-projecto e em março de 2017, quando se aprovou o projecto de execução, ainda não se conhecia o futuro do Sistema do Metro do Mondego, é agora motivo para perguntar ao Sr. Presidente, como é que este projecto, repito acabado de consignar, não prevê a integração do canal de MetroBus? Afinal porque é que o projecto não foi atempadamente revisto?
É certo que, se à data da aprovação do projecto de execução, a Sociedade Metro Mondego (MM) não levantou qualquer condicionante à reformulação da praça, também é certo que nessa altura, o projecto do SMM previa a construção do túnel de Celas, que nos entretantos afundou tal como a esperança da cidade de Coimbra vir a dispor de um sistema de transportes rápido, atrativo e competitivo. Face às alterações assumidas pelo Governo e aceites pela Autarquia no que respeita o SMM, defendemos que a MM deve voltar a ser ouvida sobre a viabilidade desta intervenção, já que as condições de operação são agora completamente distintas.
Recomenda-se ainda que esta Câmara Municipal analise o estudo “Compatibilização do Eixo Urbano do MLM com os Sistemas Rodoviário e Pedonal: Análise dos Pontos Críticos” desenvolvido, em 2003, pela Universidade de Coimbra para a Metro Mondego, no âmbito do qual se avaliou a dispensabilidade do túnel de Celas. Embora se justifique proceder a uma atualização deste estudo, nomeadamente em termos de procura de tráfego automóvel e pedonal, as conclusões retiradas tenderão a manter-se. A solução então proposta procurou otimizar o sistema global e assentou no pressuposto básico de que a R. Augusto Rocha serviria essencialmente o Metro sendo as funções rodoviárias transferidas para a R. Augusta. Esta solução garantia a segregação física do canal do metro, assumia a reformulação do Largo de Cruz de Celas transformando-o em rotunda compacta centrada com a diretriz da Rua Augusta, confinando assim os conflitos Metro-Rodovia à R. Gomes Freire e à R. Bernardo de Albuquerque. Mesmo assim e dependendo dos cenários de procura considerados, estimava-se um funcionamento no limiar da saturação ou condições saturadas, razão pela qual se recomendou a solução em túnel.
Complementarmente, e para garantir a segregação do SMM, o estudo confinava o perfil transversal do trecho entre a rotunda da Avª Calouste Gulbenkian e a de Cruz de Celas a um perfil 2x2. O projecto agora consignado alarga as atuais 2 vias para 3, reforçando a componente rodoviária e contrariando os princípios subjacentes à linha de financiamento: Prioridade de Investimentos 4.5 - promoção de estratégias de baixo teor de carbono…
O Sr. Presidente ao avalizar esta intervenção, está a mostrar, mais uma vez, que esta Câmara já não acredita no projeto do MetroBus e muito menos que o mesmo venha a ser concretizado nos próximos dois anos. Um projecto que deveria ser estruturante e central à reformulação de todo o sistema de transportes, continua a ser continuamente ignorado nas intervenções que se anunciam. Os sinais são diversos: avança-se com uma avenida central que apenas assegura um sentido de trânsito quando a solução metro previa os dois, reformula-se o Cruzamento de Cruz de Celas que não contempla e inviabiliza o canal de atravessamento pelo MetroBus, avança-se com o reforço dos muros de contenção do Mondego, sem que se reequacione a variante pela Avª Fernão de Magalhães, etc, etc.
Desconhece-se se a nova praça de celas vai ser semaforizada, ou se se prevê um funcionamento do tipo rotunda, nos termos previstos da p) do art. 1.º do Código da Estrada (Lei n.º 72/2013). Por falta de tempo, não nos vamos pronunciar sobre a qualidade técnica da solução, a qual, e independentemente do modo de regulação, apresenta deficiências técnicas graves, quer no campo da fluidez do tráfego quer da segurança automóvel e pedonal.
Estes projetos, pela relevância que assumem para a cidade e para a população em geral, carecem de olhares críticos de diferentes perspectivas e orientações. À semelhança do que acontece em alguns municípios, a título de exemplo o de Viseu, o SC propõe que a CMC crie uma Comissão Municipal de Mobilidade, Trânsito e Transportes, envolvendo a sociedade civil, forças policiais, serviços de emergência e outros stakeholders, capaz de avaliar as implicações, potencialidades e debilidades deste tipo de projectos.